sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Estrutura do Crime: sujeito ativo e passivo, capacidade e objeto do crime



Prof. Ms. Roger Moko Yabiku


1.   Sujeito ativo

No Direito Penal, sujeito ativo é quem pratica a conduta (ação ou omissão) criminosa. Há de ser o crime uma ação humana, afirma Cezar Roberto Bitencourt – em Tratado de Direito Penal – Volume 1 Parte Geral (p. 286), que tenha como sujeito ativo o ser vivo nascido de mulher, “embora em tempos remotos tenham sido condenados, como autores de crimes, animais, cadáveres e até estátuas”.
A pedra angular da Teoria do Delito, analisa Bitencourt (p. 286), é a conduta (ação ou omissão), algo exclusivo do ser humano: “A capacidade da ação, de culpabilidade, exige a presença de uma vontade, entendida como faculdade psíquica da pessoa individual, que somente o ser humano pode ter.”
O sujeito ativo é a pessoa definida na norma como possível autora do ilícito penal e que é, via de regra, pessoa física. “Sujeito ativo, autor, ou agente, é todo aquele que realiza a ação ou omissão típica, nos delitos dolosos ou culposos. Ou seja, é aquele cuja atividade é subsumível ao tipo legal incriminador”, define Luiz Régis Prado, em Curso de Direito Penal Brasileiro – Volume 1 Parte Geral (p. 258).
“O conceito abrange não só aquele que pratica o núcleo da figura típica (quem mata, subtrai etc.), como também o partícipe, que colabora de alguma forma na conduta típica, sem, contudo, executar atos de conotação típica, mas que de alguma forma, subjetiva ou objetivamente, contribui para a ação criminosa”, complementa Fernando Capez, em Curso de Direito Penal – parte geral Volume 1 (p. 167).
Conforme a posição no processo, ensina Capez (p. 168), o sujeito ativo pode ser chamado de agente (art. 14, II, do Código Penal), indiciado (art. 5º, § 1º, b, do Código de Processo Penal), acusado (art. 185, CPP), denunciado, querelado (art. 51, CPP), réu (art. 34, CP; art. 188, CPP), sentenciado, condenado (art. 34, CP), recluso, ou detento. Quando estudado pelas ciências criminais, é criminoso ou delinquente.
Complementam Paulo José da Costa Júnior e Fernando José da Costa, em Curso de Direito Penal (p. 115): “Por vezes, o sujeito-agente deverá ser qualificado, ocupando determinada posição social, ou dotado de certo status, como por exemplo ser funcionário público no peculato, cônjuge na bigamia, ou desfrutar de determinada situação fática, como a mulher grávida no aborto. Nessas hipóteses apresenta-se a figura do crime-próprio, que se contrapõe àquela do crime comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa, qualificada ou não. Costuma-se distinguir o crime próprio exclusivo, em que a execução importa na intervenção pessoal do agente designado pela lei, do crime próprio não exclusivo, que admite a figura do extraneus, que age em concurso com o sujeito qualificado.”
Cabe fazer alguns adendos, ainda no tocante ao assunto sujeito ativo, em termos de Direito Penal. É autor quem realiza ou executa o núcleo do tipo penal. O coautor realiza conjuntamente a conduta criminosa com o autor. O partícipe colabora com o crime sem realizar ou executar o núcleo do tipo. O partícipe moral faz nascer a idéia (induz) ou reforça a idéia para realizar o ato criminoso. Maiores detalhes a respeito de autor, coautor e partícipe serão abordados em texto específico.


2.   Sujeito passivo




O sujeito passivo do crime – o ofendido, ou vítima – é “titular do bem jurídico tutelado pela norma penal, que vem a ser ofendido pelo crime”, ensinam Paulo José da Costa Júnior e Fernando José da Costa (p. 115). O Estado é o sujeito passivo constante de todo o crime pelo fato de a Lei Penal situar-se no ramo predominantemente público, enquanto a pessoa que teve o bem diretamente atingido pelo crime é o sujeito passivo variável.
Também não se pode confundir sujeito passivo do crime com sujeito passivo da ação, alertam Paulo José da Costa Júnior e Fernando José da Costa, visto que sujeito passivo da ação é aquele sobre o qual recai materialmente a ação ou omissão criminosa. “Também não se confunde o sujeito passivo com aquele que suporta o dano. No homicídio, sujeito passivo é o morto; sofrem o dano os familiares. Assume relevo o sujeito passivo sob diversas angulações, inclusive qualificando o interesse jurídico tutelado, como no crime de desacato, que constitui hipótese particular de injúria caracterizada pelo fato de que o ofendido é um funcionário público (art. 331 do CP).” (p. 115)
      Em resumo. Sujeito passivo constante (geral, genérico, formal, mediato, ou indireto) é o Estado, titular do “jus puniendi”. Sujeito passivo variável (particular, material, acidental, eventual ou direto) é a pessoa física (crimes contra a pessoa, por exemplo) ou jurídica (crimes contra o patrimônio, por exemplo) vítima da lesão ou ameaça de lesão. O sujeito passivo também pode ser indeterminado (coletividade – crimes contra a saúde pública - e família, por exemplo).
            Podem ser sujeitos passivos o nascituro, o incapaz e o Estado (crimes contra a administração pública, por exemplo). Não podem ser sujeitos passivos, no âmbito criminal, o animal, a planta e o ser inanimado. Explica melhor Luiz Régis Prado (p. 258-259): “Podem figurar como sujeitos passivos – vítimas, ofendidos -, a pessoa física ou o indivíduo, mesmo incapaz, o conjunto de indivíduos, a pessoa jurídica, a coletividade, o Estado ou a comunidade internacional, de acordo com a natureza do delito. Tem crescido de importância, no campo político-criminal, o papel da vítima na realização do delito. Nesse particular aspecto, encaminha-se para uma constante busca do ponto de equilíbrio entre liberdade individual e defesa social.”
            Importante não confundir sujeito passivo com objeto material do crime ou objeto material da conduta, alerta Prado (p. 259), que é “parte do mundo exterior (pessoa ou coisa) sobre a qual recai a ação ou omissão típica e ilícita”.



3.   Capacidade Penal

Consiste a capacidade penal na aptidão para se adquirir direitos e obrigações na esfera penal. Na capacidade penal geral, qualquer pessoa pode praticar o crime. Na capacidade penal especial, o crime pode ser praticado só por pessoa que possua determinada posição jurídica ou de fato. No tocante à capacidade penal especial permissiva, o direito de excluir crime ou pena é outorgada para determinada pessoa.
Capacidade penal é diferente de imputabilidade penal. A capacidade penal é anterior ao crime, consistindo num conjunto de condições para ser titular de direitos e obrigações penais. Já a imputabilidade penal é contemporânea ao crime, sendo a capacidade de entender e querer a infração penal.
A incapacidade penal é a inaptidão para adquirir direitos e obrigações na área penal. Abrange o morto, entes inanimados, semoventes e quando a lei não se aplica a determinadas pessoas.



4.   Objeto do crime

4.1.        Objeto jurídico
É o bem ou o interesse protegido pela norma penal, usado para classificar os crimes. “É a vida, no homicídio; a integridade corporal, nas lesões corporais; o patrimônio, no furto; a honra, na injúria; a dignidade e a liberdade sexual da mulher, no estupro; a administração pública, no peculato, etc”, ensina Capez (p. 176-177).
Luiz Régis Prado (p. 148) prefere denominar bem jurídico: “De outro lado, o bem jurídico vem a ser um ente (dado ou valor social) material ou imaterial haurido do contexto social, de titularidade individual ou metaindividual reputado como essencial para a coexistência e o desenvolvimento do homem e, por isso, jurídico-penalmente protegido. E, segundo a concepção aqui acolhida, deve estar sempre em compasso com o quadro axiológico (Wertbild) vazado na Constituição e com o princípio do Estado democrático e social de Direito.”
Assim, a lesão a bem jurídico ocorre quando existe uma relação de causalidade entre a ação típica e o valor protegido pela norma penal. Esse valor protegido pela norma penal pode, ou não, encarnar-se no objeto da ação.
            Objeto jurídico genérico é o bem protegido no título da Lei Penal. Objeto jurídico específico é o bem jurídico especificado em cada capítulo. Por sua vez, o objeto jurídico individual tem como titular o indivíduo. Já a titularidade do objeto jurídico transindividual é o grupo ou a coletividade.

4.2.        Objeto material (substancial)
            É a pessoa ou a coisa sobre a qual recai a ação criminosa. Segundo, Prado (p. 247), “objeto da ação vem a ser o elemento típico sobre o qual incide o comportamento punível do sujeito ativo da infração penal.” “Trata-se do objeto real (da experiência) atingido diretamente pelo atuar do agente. É a concreta realidade empírica a que se refere a conduta típica. Essa realidade – passível de apreensão sensorial – pode ser corpórea (v.g., pessoa ou coisa) ou incorpórea (v. g., honra). Em outros termos, o objeto material ou da ação é formado pelo ser animado ou inanimado – pessoa ou coisa (animal) – sobre o qual se realiza o movimento corporal do autor que pratica uma conduta típica no círculo dos delitos a cuja descrição pertence um resultado tangível. Tem sido afirmado, com acerto, que, enquanto o conceito de objeto da ação pertence substancialmente à consideração naturalista da realidade, o de bem jurídico, ao contrário, corresponde, em essência, à consideração valorativa sintética”, arremata Prado.
            Objeto material é diferente de instrumento do crime (meio usado para o crime) e de corpo de delito (vestígios deixados pelo crime). Em alguns casos, o objeto material pode coincidir com o sujeito passivo do crime (homicídio, por exemplo).

Leia mais:
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral 1. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral. Volume 1. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
COSTA JR, Paulo José da; COSTA, Fernando José. Curso de Direito Penal. 12. ed. rev. atua. São Paulo: Saraiva, 2010.
PRADO, Luiz Regis. Comentários ao Código Penal. 6. ed. rev. atua. ampl. São Paulo: RT, 2011.
____. Curso de Direito Penal Brasileiro. Volume 1. Parte Geral – arts. 1º a 120. 6. ed. rev. atua. ampl. São Paulo: RT, 2006.
TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios Básicos de Direito Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Teoria do Delito



Prof. Ms. Roger Moko Yabiku[1]

1.  Conceito de delito
      A definição de crime – sinônimo de delito no Brasil - que se utiliza atualmente é fruto das doutrinas alemãs que começam a florescer a partir do século XIX. Influenciado pelo método analítico, característico do pensamento científico, o conceito de delito foi aperfeiçoado em outros países como Itália, Espanha, Portugal, Grécia, Áustria e Suíça.

1.1.        Conceito material de delito
O conceito material de crime é a violação de um bem penalmente protegido, ou seja, o conteúdo do ilícito penal (danosidade ou lesividade social) ligado a valores constitucionais (lesão ou perigo de lesão a bem juridicamente protegido).

1.2.        Conceito formal de delito
Entende-se por conceito formal, a conduta proibida por lei, com ameaça de sanção criminal, a contradição entre o fato concreto e o preceito legal, sendo a expressão do Direito Positivo vigorante, com ameaça de consequência no âmbito penal (pena ou medida de segurança).

1.3.        Conceito analítico de delito
No seu aspecto analítico (ou dogmático), conceitua-se crime como fato típico, antijurídico e culpável. Há de se decompô-lo em partes estruturadas axiologicamente em relação lógico-abstrata. O fato típico se ajusta ou se subsume ao modelo abstrato descrito no tipo penal. O ilícito é o fato típico não abrangido por causa de justificação. O fato típico e antijurídico é culpável se a conduta do autor for reprovável.
Assim, existe uma sequência lógica necessária: ação ou omissão pode ser típica, só quando a ação ou omissão for típica pode ser ilícita, e só quando a ação ou omissão for típica e ilícita que pode ser culpável.
Atenção! Muitos doutrinadores brasileiros consideram o crime como fato típico e antijurídico, sendo a culpabilidade pressuposto de pena. A punibilidade não se encaixa no conceito analítico de crime, pois é sua consequência. A exclusão da punibilidade, então, pela falta de condição objetiva ou por escusa absolutória, exclui o conceito de crime.

1.4.        Conceito legal de delito e de contravenção
O artigo 1º da Lei de Introdução ao Código Penal (Decreto Lei nº 3.914/41) traz a definição: “Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.”
O atual Código Penal, diferentemente dos Códigos Penais de 1830 (art. 2º, § 1º) e de 1890 (art. 7º), não define crime, cuja tarefa se deixou à doutrina. A Lei de Introdução ao Código Penal apenas distingue as infrações como crime e como contravenção penal, a partir da pena de prisão aplicável.
Adotou o Brasil, portanto, a classificação bipartida das infrações penais: crime (ou delito) e contravenção penal. Na Alemanha, Rússia e França, por exemplo, utiliza-se a classificação tripartida: crimes, delitos e contravenções penais, conforme a gravidade apresentada.
O critério da distinção é de política criminal, de base quantitativa ou extrínseca. Então, os crimes são punidos com penas privativas de liberdade (detenção ou reclusão), penas restritivas de Direitos e multa (art. 32, do Código Penal). As contravenções, por sua vez, são punidas com prisão simples e/ou multa (art. 5º, do Decreto-Lei 3.668/41). O elemento subjetivo do crime é o dolo ou a culpa; o da contravenção é a voluntariedade. Nos crimes, é possível a tentativa, o que é incabível nas contravenções.
A petição inicial dos crimes se dá por denúncia ou queixa. Nas contravenções, a inicial é só por denúncia. A prática de crimes no exterior pode ser punida no Brasil, o que não se dá com relação às contravenções penais.


2.  Evolução do conceito de delito

2.1.      Sistema Causal-Naturalista (Escola Clássica)

Trata-se da influência do positivismo científico no Direito Penal, a partir do século XX, afastando, portanto, valorações filosóficas, psicológicas e sociológicas. A ação é concebida como mero movimento corpóreo voluntário – uma inervação muscular produzida por energias de um impulso cerebral, provocando modificações no mundo exterior[2]. Vincula-se o conceito de ação, por meio do nexo de causalidade, ao resultado.
O aspecto objetivo do delito contém a tipicidade e a antijuridicidade. E o aspecto subjetivo, a culpabilidade.
Ernst Beling e Friedrich Von Liszt são seus principais representantes. Beling, professor da Universidade de Munique, em 1906, escreveu “Die Lehre Von Tatbestand”, na qual elaborou uma teoria do delito (Gezetzliche Tatbestand). Delito tipo é o molde, modelo em que se encaixam fatos da vida comum.
Respondeu Von Liszt pela separação clara entre antijuridicidade e culpabilidade, conforme critérios objetivos e subjetivos. A estrutura do delito, portanto, é fato típico, antijurídico e culpável. A ação foi concebida naturalisticamente, como um tipo objetivo-descritivo. A antijuridicidade seria objetivo-normativa e a culpabilidade, por conseguinte, subjetivo-descritiva.

2.1.1.   Ação

Há quatro elementos na estrutura do crime segundo a teoria clássica: ação, tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade. No início, ação tinha conceituação puramente descritiva, objetiva, naturalista e causal. Apesar de ser oriunda da vontade, valorativamente era neutra, sem se preocupar com conteúdo dela, só com relação àquilo (objetivamente) que causaria resultado no mundo exterior.
Von Liszt, influenciado pelo positivismo cientificista, concebeu a ação como inervação muscular originada de energia de impulso cerebral, nos termos das leis da natureza, com consequências no mundo exterior.

2.1.2.   Tipo e tipicidade

A tipicidade e o tipo representariam a exterioridade da ação, contendo, em si, só aquilo de objetivo do fato legalmente descrito. As circunstâncias subjetivas, ou internas, do delito inserir-se-iam na culpabilidade, em vez de no tipo ou na tipicidade.
Beling descreveu o tipo e a tipicidade mais com caráter descritivo, neutros em termos de valor. Em 1915, Mayer, apoiando-se ainda na descritividade, salientou que tipicidade era indício de antijuridicidade. Assim, segundo Mayer, há probabilidade de toda conduta típica ser antijurídica, caso não incida causa de justificação (causa excludente de ilicitude).

2.1.3.   Antijuridicidade
A antijuridicidade constituiria o elemento objetivo, valorativo e formal. Seria um juízo de valoração negativa da ação, um juízo de desvalor, que incidiria apenas na questão objetiva, com a gênese de resultados indesejados juridicamente, ou seja, externamente negativos. Seria um juízo valorativo puramente formal.

2.1.4.   Culpabilidade
Com caráter também descritivo, a culpabilidade seria o aspecto subjetivo do crime. Consistia simplesmente na constatação (comprovação) de um vínculo subjetivo entre autor e fato.
Posteriormente, houve fusão da teoria causal-naturalista com a teoria psicológica da culpabilidade (esta seria o vínculo psicológico que une o autor ao fato por meio do dolo e da culpa). Conforme a intensidade desse nexo psicológico, a forma de culpabilidade seria dolosa ou culposa.



2.2.      Sistema Neoclássico (Escola Neoclássica)
Trata-se da influência da teoria do conhecimento da filosofia neokantiana[3] no Direito Penal, aliada ao método científico-naturalístico (observar e descrever), que recuperou uma metodologia típica das ciências humanas (ou do espírito): compreender e valorar. Atentou-se, especialmente, ao normativo e ao axiológico. A coerência formal jurídica, fechada em si mesma, foi substituída por um conceito de crime (delito) segundo os fins perseguidos pelo Direito Penal e suas perspectivas de valor. Ou seja, uma teoria teleológica do delito.

2.2.1.   Ação e tipo
A estrutura de delito da teoria clássica sofreu uma transformação. No sistema clássico, o conceito de ação de concepção meramente naturalística era frágil, principalmente relacionado aos crimes omissivos, culposos e na tentativa. A teoria neoclássica, com relação à tipicidade, incluiu elementos normativos (conteúdo de valor), reconhecendo, inclusive, elementos subjetivos do tipo, enquanto a teoria clássica utilizava somente aspectos objetivos.

2.2.2.   Antijuridicidade
Na teoria clássica, antijuridicidade, concebida em termos formais, no sistema neoclássico, ganhou roupagem material (exigibilidade de danosidade social), possibilitando a graduação do injusto proporcionalmente à lesão ocasionada. Com isso, a teoria da antijuridicidade material afirma que, se não houver lesão de interesse social, o fato pode ser típico, mas não antijurídico, originando novas causas de justificação (excludentes de ilicitude), não se encerrando nas previstas em lei.

2.2.3. Antijuridicidade e tipo: tipo de injusto
      Na teoria clássica, o tipo descrevia um processo exterior. No sistema neoclássico, ganhou mais corpo, transformando-se em tipo de injusto, muitas vezes, englobando ora elementos normativos, ora elementos subjetivos. Com o novo conceito material de antijuridicidade (danosidade social), houve introdução de observações axiológicas e teleológicas, o que possibilitou a interpretação restritiva de condutas antijurídicas.

2.2.4     Culpabilidade como reprovabilidade
Nesse momento teleológico, a culpabilidade, por influência de Frank, ganhou caráter de reprovabilidade – uma formação de vontade contrária ao dever. Houve influência da teoria psicológico-normativa (ou teoria normativa da culpabilidade), que conservou elementos de conteúdo psicológico (dolo e culpa), mais a imputabilidade e a exigibilidade de conduta diversa, resolvendo problemas que a teoria psicológica da culpabilidade (da Escola Clássica) não consegui solucionar.


2.3 Sistema Finalista (Teoria Finalista da Ação)
A Escola Finalista de Hans Welzel aperfeiçoou o conceito de culpabilidade, redefinindo a teoria do delito. Nos idos de 1930, Welzel centrou a ação humana no conceito delito, sendo o ponto nevrálgico da sua estrutura analítica, ontologicamente considerada. Abandonou o logicismo e a abstração dos conceitos anteriores, sanando eventuais falhas e contradições.

2.3.1 Do injusto naturalístico ao injusto pessoal
Diferente do conceito causal de ação (inclusive a separação entre vontade e o seu conteúdo), convertendo o injusto naturalístico em injusto pessoal (eliminando a separação dos aspectos objetivos dos aspectos subjetivos da ação).

2.3.2 Concepção normativa de culpabilidade
Retirou os elementos subjetivos da culpabilidade, concebendo-a de maneira puramente normativa. O dolo e a culpa passaram a integrar o fato típico, assim, a finalidade foi transferida para o centro do injusto. Na culpabilidade, permaneceram apenas aquilo que condicionava a reprovabilidade da conduta (diversa ao Direito), cuja reprovação localizava-se no injusto. À noção de culpabilidade, somam-se a de imputabilidade, potencial consciência de ilicitude e exigibilidade de conduta diversa.

2.3.3 Dolo e culpa como elementos do injusto pessoal
Passou-se, então, a diferenciar tipos dolosos e culposos. Dolo e culpa não seriam mais elementos da culpabilidade, mas seriam parte da ação e do injusto pessoal. Importante ressalvar que finalidade é diferente de dolo. Para Welzel, ainda, o crime também ensejaria a presença da culpabilidade. O finalismo ainda tinha na estrutura do crime a ação típica, antijurídica e culpável (teoria finalista tripartida). No entanto, o Direito Penal brasileiro acatou a teoria finalista bipartida, que estrutura o crime como ação típica e antijurídica, sendo a culpabilidade pressuposto de imposição de pena.

2.4 Sistema Social
            A ação criminosa (ou delitiva) é concebida como fenômeno social, conforme o valor dos seus efeitos na realidade. A ação (conduta humana) socialmente relevante é a solução conciliatória entre pura consideração ontológica (ser) e normativa (dever ser). Crime é fato típico, antijurídico e culpável. Dolo e culpa são elementos subjetivos da conduta, porém, considerados no tipo.

2.5. Sistema Funcionalista (Escola Normativista)
            Tendo como ponto de partida o Direito Positivo, o método é conhecer o objeto da investigação, buscando a solução justa para o caso concreto. O Direito Penal deve ser entendido – estruturado, interpretado, aplicado e executado – de acordo com sua função em determinado contexto social – segundo a função das penas e das medidas alternativas à prisão.
            Em 1970, Claus Roxin[4] escreveu “Kriminalpolitik und Strafrechtssystem” (Política Criminal e Sistema de Direito Penal). Na obra, Roxin defende que a função do Direito Penal é proteger subsidiariamente bens jurídicos essenciais. É última ratio, ou seja, aplica-se ao caso concreto conforme uma ótica teleológica-racional. Roxin é enquadrado enquanto funcionalista moderado. Em sua teoria, há de se reconstruir a teoria do delito segundo critérios de política criminal.
            A partir do funcionalismo sistêmico de Niklas Luhmann, Günther Jakobs[5] construiu o funcionalismo radical, baseado no método dedutivo (lógico-formal). Em comum nas teorias funcionalistas, é que a sanção é necessária para o fortalecimento da autoridade da norma – reforçando as expectativas dos seus destinatários.


[1] Advogado, jornalista e professor universitário. Bacharel em Direito e Jornalismo, Graduado pelo Programa Especial de Formação de Professores de Filosofia, Pós-Graduado MBA em Comércio Exterior, Pós-Graduado Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal, Mestre em Filosofia (Ética). e-mail: ryabiku@adv.oabsp.org.br
[2] Concepção de Von Liszt.
[3] Vide Stammler, Rickert e Lask.
[4] Roxin também aperfeiçoou a teoria da imputação objetiva.
[5] A partir de leituras das doutrinas do contrato social, Jakobs elaborou a teoria do Direito Penal do Inimigo (Feindstrafrecht).